segunda-feira, 13 de setembro de 2010

ANTIGA ESCOLA DE APRENDIZES

Não era festa. Nem mesmo um preparativo de festa. Mas um nordestino ou bom conhecedor do Nordeste, mesmo de olhos fechados, poderia afirmar com segurança que aqueles aglomerados e compridas filas de jovens mostravam cenas que todos os anos, nas mesmas épocas, significavam atividades dos exames de admissão às Escolas de Aprendizes de Marinheiro. Não somente das temidas provas escritas e desportivas, mas também dos procedimentos de inscrições, preenchimentos de listas de informações e comparecimento a exames físicos e médicos, etc.
Desde os povoados distantes afluíam candidatos esperançosos, que se juntavam ao “povo” das capitais e cidades grandes como Recife, Salvador e muitas outras, todos atraídos por colocar em seus futuros aquela vontade de servir e fazer carreira da Marinha do Brasil.

Havia, dentro da burocracia usual, porém, uma folha a ser preenchida pelo candidato e destinada à recomendação do mesmo, atestada e rubricada por uma autoridade. Em tal processo via-se escrito, mais ou menos, o seguinte: “Recomendo a aceitação do candidato em epígrafe, caso aprovado quando avaliado. Opino favoravelmente quanto à sua idoneidade moral e sanidade mental – assinado por um Oficial de Força Armada, Juiz, Sacerdote, Delegado de Polícia ou detentor de cargo político/público, aqui especificado no espaço em branco”.

Naquela manhã específica que justificava nossa história, porém, o sargento Severino empunhava, para a vista de seu chefe, o Tenente Abreu, o modelo de documento no qual estava assinada a recomendação dirigida ao Comandante do Distrito Naval. Acabara de mostrar ao superior uma rubrica que se referia à anuência de um certo Juiz de ... futebol da Federação Pernambucana, o qual recomendava o ingresso na Escola de um certo candidato da terra. O auxiliar de secretaria Severino mostrava que o papel que lhes estava dirigido não podia ser avaliado, pois o candidato entendera que o Juiz ali mencionado podia ser o conhecido árbitro das canchas pernambucanas e, por outro lado, seu único signatário. Embora o desempenho, nos exames, do afilhado do Juiz alcunhado de “Dr. Watson”, fosse impecável, ele era o único informante que assinava o documento, fazendo, assim, o papel do que constava das instruções impressas. O que fazer então? O Tenente mandou que o Sargento se comunicasse com o árbitro, para que este comparecesse à Escola e esclarecesse melhor o assunto, no sentido de verem o que poderia ser feito para aproveitar o candidato a aprendiz José Amâncio.

De fato, pouco depois o Juiz chegava e, com inesperada verve, confirmava a indicação constante do papel. Aproveitando a presença do famoso árbitro, passaram o restante da tarde conversando sobre episódios do futebol pernambucano.

Hoje, passados tantos anos, o candidato a aprendiz daquele dia ostenta as merecidas insígnias de Capitão-Tenente da Marinha. E o “Dr. Watson” fez justiça às condecorações que, mais que a popularidade, no modesto caso, na verdade conhecido de poucos, o favoreceu junto às torcidas, exceto, é claro, quando uma decisão sua de gramado era tida como prejudicial.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DEIXE SEU COMENTÁRIO